quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

pessoas

.. e sentei-me no metro durante uma quantidade de tempo absurda, não sei se foram minutos ou dias, as pessoas entravam e eu reparava em quase todos os pormenores; a forma como a rapariga gesticulava para se justificar às suas amigas, o namorado que tentava apaziguar a discussão que anteriormente havia criado, o senhor cego que espera o momento em que alguém deixe cair uns cêntimos de compaixão. Antes disso, já tinha entrado uma senhora que se queixava do seu emprego e um homem que metia conversa com uns estudantes, fascinado com a lembrança dos seus melhores anos. Nisto tudo, uma mãe aninhava o bebé contra o seu peito, como se o cansaço não chegasse nunca. Eu deixava-me levar; tinha todo o tempo para constatar a inutilidade da vida, a dor do tempo, a mágoa de existir. As pessoas entravam e saiam, senhores de fato e senhoras de traje muçulmano, punks e góticos com meninas de pérolas, mulheres de cabelo armado e emigrantes estafados.Alguns deles reparavam em mim mas logo desviavam o olhar, pudesse a preocupação ser chamada de pecado.
E eu queria que eles olhassem para mim, queria que eles me vissem e ouvissem e queria poder dizer aquilo que eu mesma gostava que me dissessem, agora que estou cansada, agora que estou velha, que a minha casa está vazia à noite, e que eu não sou se não um poço de angústia, um rosto inexpressivo.
Se recuar trinta anos revivo os meus dias de meninice em que docemente me perguntavas : danças comigo? e eu, fugidia e arisca, dizia, comigo não tens sorte nenhuma, mas tiveste, tanta ou tão pouca que nos anos que se seguiram foste o único homem que amei.
Há um mês atrás entravas nesta estação. Caminhavas decidido, segundo os testemunhos. Só gostava que antes de saltares para a morte, te tivesses lembrado que podiamos ter dançado o resto da vida. Agora, não há sorte que me valha.

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